Por que presidente não conversou com Biden em Nova York
O presidente Jair Bolsonaro não deve conversar com o mandatário dos Estados Unidos, Joe Biden
Por Mariana Sanches
Os presidentes dos Estados Unidos, Joe Biden, e do Brasil, Jair Bolsonaro, possivelmente nunca tiveram tanto em comum como no período de aproximadamente 24 horas entre a tarde do dia 20 e o fim da manhã do dia 21 deste mês.
Ambos dividem o mesmo teto e o mesmo palco político: Biden e Bolsonaro falarão um na sequência do outro na abertura da 76ª Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), na manhã de ontem, e estão hospedados no hotel International Barclays, na cidade de Nova York.
Apesar da coincidência de agendas — e das intensas gestões pelo lado brasileiro para que os dois presidentes tivessem seu primeiro encontro formal desde que o democrata assumiu o comando da Casa Branca —, é improvável que eles se falem por mais do que poucos segundos.
“Seria ótimo para quebrar esse gelo bobo”, afirmou um alto funcionário do Itamaraty, que torce para que a troca de postos no púlpito da Assembleia Geral possa render ao menos cumprimentos cordiais, embora breves, entre os dois mandatários.
Em 2019, foi justamente nesse momento que o então presidente americano Donald Trump elogiou o discurso de Bolsonaro, que respondeu dizendo que o amava. Nada parecido é esperado agora, no entanto.
Desde que Biden chegou à Casa Branca, em janeiro, ele e Bolsonaro jamais se falaram diretamente, nem mesmo ao telefone, apesar de Biden ter falado com mais de três dezenas de líderes ao redor do mundo, incluindo o argentino Alberto Fernández. Ambos se limitaram a trocar cartas.
Durante a acirrada campanha eleitoral americana em 2020, Bolsonaro não fez segredo sobre sua preferência pela vitória do republicano Trump, de quem é próximo. Após o triunfo de Biden, o mandatário brasileiro chegou a mencionar acusações infundadas de fraude eleitoral nos EUA e foi o último dentre os líderes do G-20 a reconhecer a vitória do democrata.
Intermediários entre os dois presidentes
De lá pra cá, diversos setores dos governos de Brasil e EUA seguem engajados em diálogos e trocas, mas há uma clara percepção entre diplomatas de que Biden evita o engajamento direto com Bolsonaro e aproveita a presença de seu secretariado para manter entre si e o colega brasileiro um número razoável de intermediários.
No Departamento de Estado, Bolsonaro tem sido visto como pouco previsível, o que poderia resultar em interações pouco seguras ou vantajosas para o americano, que tenta reafirmar o protagonismo dos Estados Unidos no diálogo multilateral, depois da gestão de Trump, que primava por relações bilaterais e focadas em poucos aliados.
Uma interação breve, mas positiva, na ONU, dependerá não só do histórico de ações de Bolsonaro, mas também de suas palavras nos 20 minutos de discurso. Até a noite de segunda (20/09), a menos de 12 horas do evento, o teor da fala do brasileiro não estava 100% fechado.
O deputado federal Eduardo Bolsonaro, filho do presidente que o acompanha na viagem, chegou a comentar com jornalistas que passaria ao menos duas horas com o pai editando o conteúdo elaborado primariamente pelo Itamaraty. O texto original era construído em três pilares: meio ambiente, vacinas e economia. Acenos à base eleitoral devem ser incluídos.
O difícil equilíbrio entre pragmatismo e pautas ideológicas deve determinar a reação pelos americanos. Na descrição feita reservadamente por um auxiliar de Bolsonaro à reportagem, na manhã desta segunda, “o presidente está muito bem disposto e sempre preparado para fazer uma besteira”.
Fonte: BBC/Foto: Alan Santos/PR/GETTY IMAGES